‘Pedagogia do amor’: projeto pratica solidariedade entre estudantes em Manaus

Um tapete vermelho e plaquinhas com o dizer “Eu te amo”. Esta breve descrição poderia se referir a alguma premiação do cinema – mas não desta vez. Saem de cena astros hollywoodianos, dando espaço a estudantes da Escola Estadual Benedito Almeida, localizada no Mauazinho, Zona Sul de Manaus. Os prêmios também são diferentes. Nada de estatuetas douradas, e sim abraços, sorrisos e palavras de incentivo: são eles os ingredientes principais do projeto Alunos Mais que Especiais, ou apenas Ame, realizado por jovens do Grêmio Estudantil Voz Ativa (Geva), da unidade de ensino.

Lançada na última quarta-feira (12/06), a iniciativa tem como objetivo trazer o incentivo escolar aos alunos de uma maneira menos pedagógica e mais humana. Pelo menos uma vez por mês, na própria instituição, os integrantes do Geva receberão os demais estudantes e funcionários como verdadeiras estrelas, com direito a tapete vermelho, abraços, sorrisos e palavras inspiradoras.

Além disso, o grupo colocará em prática um serviço de atendimento direcionado aos alunos da unidade, no qual os mesmos poderão desabafar sobre quaisquer problemas que estejam passando – seja em âmbito escolar ou familiar. A atividade funcionará numa sala específica, intitulada Fale Sem Medo.

“Nós [alunos] acabamos nos acostumando com a rotina escolar e, muitas vezes, ficamos cansados. Muitos estudantes já chegam à escola sem incentivo nenhum da família e o projeto Ame mostrará para eles que são capazes, importantes e mais que especiais”, explicou a presidente do grêmio estudantil, Lídia Isabelle Oliveira.

Início

A ideia para o Ame surgiu há aproximadamente um mês, em uma conversa entre três membros do Geva: Mikael Araújo, tesoureiro; Lara Souza, diretora; e Lídia Isabelle. “Estávamos participando do projeto Jovem Parlamentar e pensamos na quantidade de alunos da nossa escola que gostariam de estar ali, passando por aquela experiência, mas que não acreditam em si mesmos ou precisam de ajuda, palavras de conforto. Pensamos num projeto para trazer mais amor a nossa instituição, queremos que nossos estudantes se sintam à vontade”, afirmou Mikael.

A partir daí, o grupo passou a pensar em pequenas ações e gestos diários que pudessem fazer a diferença na vida desses alunos. “Nós [do grêmio estudantil] passamos a nos reunir e a estudar sobre a importância de se ter empatia com o próximo, de se colocar no lugar dele e se importar com dor que ele carrega. Vínhamos à noite aqui, para a escola, para nos aprofundarmos ainda mais no tema e debatermos. Sem dúvida, foi um experiência que nos aproximou como amigos e nos fez amar ainda mais”, acrescentou a presidente do Geva.

Temáticas

O objetivo dos jovens é que cada edição do Ame aborde um tema distinto, como depressão, suicídio, abuso sexual e bullying, dentre outros. Além do diálogo direto com os estudantes, na sala Fale Sem Medo, eles planejam levar convidados e especialistas para palestrarem e, principalmente, ouvirem os alunos.

“Vamos chamar pessoas e profissionais que estejam acostumados e preparados a ouvir sobre esse tipo de problemas. Junto a isso, convidaremos, ainda, especialistas em áreas como teatro e música, por exemplo. Essas atividades mais dinâmicas não apenas fazem com que os estudantes se soltem mais, como, também, trabalham a inclusão desses jovens e promovem o trabalho em equipe”, destacou Lídia Isabelle.

Expansão

Junto às edições na E.E. Benedito Almeida, o Geva levará o Ame, mensalmente, para outras escolas da zona leste de Manaus. Com a mobilização, os estudantes esperam inspirar outros grêmios estudantis a seguir pelo mesmo caminho da solidariedade.

“Queremos que os demais grêmios não se limitem ao âmbito escolar por medo, pois isso faz com que os alunos não se desenvolvam. Esperamos que o projeto sirva de encorajamento para esses grupos, que eles passem, também, a propagar o amor e transformem o Ame em uma espécie de corrente. Nossos estudantes precisam de incentivos, de uma voz”, completou a presidente.

Com o tempo, o Geva pretende abrir as portas do projeto para a comunidade do Mauazinho. “Estamos estudando e nos organizando para fazermos uma coisa bem feita. É importante trabalhar o desenvolvimento junto à família, porque é ali que tudo começa. (…) Em breve, também vamos levar plaquinhas com dizeres de incentivos e distribuir abraços da avenida principal do nosso bairro”, pontuou Lídia.

Segundo a diretora de Saúde e Meio Ambiente do Geva, Tainá Leandra de Barros, o próprio aluno servirá de multiplicador das ações do Ame. A jovem acredita que, da mesma maneira que o estudante é inspirado na escola, ele pode inspirar amigos e familiares fora do ambiente de ensino. “A gente acaba refletindo neles essa vontade de ser algo. Ao participar das atividades escolares, o comportamento do aluno muda e, dessa forma, ele começa a reproduzir essas atitudes fora da sala de aula”, reforçou Tainá.

Recepção

Durante o lançamento do projeto, na terça-feira, os membros do grêmio estudantil se dividiram entre as turmas para apresentar a proposta do Ame. De acordo com a aluna Kesya Abreu, houve até comoção entre os estudantes da E.E. Benedito Almeida.

“Estávamos conversando sobre o projeto com estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio quando perguntamos: ‘O que vocês veem ao se olhar no espelho?’. Um dos alunos, então, respondeu: ‘Um nada’. Aquilo me chocou bastante e serviu para mostrar o quão necessário é o Ame. Imagina quantas vidas não podemos mudar através dele?”, questionou Kesya.

O vice-presidente do Geva, Jandher Itiel, também percebeu uma boa receptividade logo na estreia. “Já de cara a gente nota a necessidade de alguns estudantes em desabafar conosco. Hoje mesmo [terça-feira], pegamos um caso de bullying envolvendo dois alunos. Fizemos com que eles conversassem e, no fim, acabou que se acertaram, se abraçaram. Então, já vemos surtir um efeito e, com o tempo, ele será ainda muito maior”, prometeu.

Para a diretora de Cultura do Geva, Giselly Pereira Barbosa, o Ame colocará o aluno no patamar de protagonista que ele merece. “Queremos mostrar para esses estudantes que eles são especiais, sim, e, através disso, mudar a escola e a comunidade em que vivemos. Nós [alunos] passamos o ano inteiro aqui, somos praticamente família e percebemos que nem todos possuem ajuda em casa. Portanto, começamos a cuidar uns dos outros, todo mundo precisa de amor e carinho”, finalizou.

Inspiração

Para o projeto Ame sair do papel, foi necessária uma boa dose de inspiração. Inspiração esta que veio das mãos e das palavras do professor Girleno Menezes. Coincidentemente, o dia do lançamento da ação marcou, também, a despedida do educador da E.E. Benedito Almeida.

Há um ano lecionando Sociologia na unidade de ensino do Mauazinho – há cinco atuando como professor -, Girleno defende a ideia de que educação não se faz somente na escola. “Muitos [professores] ainda têm essa ideia de que nosso papel é apenas passar o conteúdo e lançar nota. Com seis meses de profissão, já percebi que isso não estava certo. Eu posso dar uma ótima aula de Sociologia, que o aluno vai à Internet e acha várias melhores. Hoje em dia, está tudo disponível na web”, comentou Girleno.

Alunos se emocionam na despedia do professor Girleno Menezes

A maneira que o educador achou de inovar foi envolvendo e incentivando os estudantes a criarem e a participarem de projetos sociais – dentre eles, o Ame. “A ideia é ocupar o tempo deles com boas iniciativas e exemplos. Quando o aluno se envolve, ele se inspira e inspira outros”, disparou.

De acordo com o professor, toda escola possui estudantes excepcionais, que só estão esperando um incentivo ou alguém que acredite neles. “Eu, sozinho, não consigo executar essas ideias e projetos. Isso só é possível através dos alunos. Você tem que incentivá-los para que eles possam, depois, inspirar mais estudantes”, encerrou Girleno.

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Fotos/Fonte: Cleudilon Passarinho/ Seduc-AM/Portal A Crítica

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